Sem Culpas nem Remorsos… Qual o caminho? (1 de agosto)

"Duas são as causas psicológicas da culpa: a que procede da sombra escura do passado, da consciência que se sente responsável por males que haja praticado em relação a outrem e a que tem sua origem na infância, como decorrência da educação que é ministrada.
A culpa é resultado da raiva que alguém sente contra si mesmo, voltada para dentro, em forma de sensação de algo que foi feito erradamente. Este procedimento preexiste à vida física, porque originário, na sua primeira proposta, como gravame cometido contra o próximo, que gerou conflito de consciência.
Quando a ação foi desencadeada, a raiva, o ódio ou o desejo de vingança, ou mesmo a inconsequência moral, não se permitiram avaliação do desatino, atendendo ao impulso nascido na mesquinhez ou no primarismo pessoal. Lentamente, porém, o remorso gerou o fenómeno de identificação do erro, mas não se fez acompanhar de coragem para a conveniente reparação, transferindo para os arquivos do Espírito o conflito em forma de culpa, que ressuma facilmente ante o desencadear de qualquer ocorrência produzida pela associação de ideias condutora da lembrança inconsciente. Quando isto ocorre, o indivíduo experimenta insopitável angústia, e procura recurso de autopunição como mecanismo libertador para a consciência responsável pelo delito que ninguém conhece, mas se lhe encontra ínsito no mapa das realizações pessoais, portanto, intransferível.
Apresenta-se como uma forte impregnação emocional, em forma de representações ou ideias (lembranças inconscientes), parcial ou totalmente reprimidas, que ressurgem no comportamento, nos sonhos, com fortes tintas de conflito psicológico.
Na segunda hipótese, a má formação educacional, especialmente quando impede a criança de desenvolver a identidade, conspira para a instalação da culpa.
Normalmente exige-se que o educando seja parcial e adulador, concordando com as ideias dos adultos – pais e educadores – que estabelecem os parâmetros da sua conduta, sem terem em vista a sua espontaneidade, a sua liberdade de pensamento, a sua visão da existência humana em desenvolvimento e formação.
É de lamentar-se que as crianças sejam manipuladas por genitores e professores, quando frustrados, que lhes transmitem a própria insegurança, insculpindo-lhes comportamentos que a si mesmos se agradam em detrimento do que é de melhor para o aprendiz.
Precipita-se-lhe a fase do desenvolvimento adulto com expressões pieguistas, nas quais se afirmam: “já é uma mocinha”, “trata-se de um rapazinho”, inculcando-lhes condutas extravagantes, sem que deixem de ser realmente crianças.
A vida infantil é relevante na formação da personalidade, na construção da consciência do Si, na definição dos rumos existenciais.
A conduta dos adultos grava no educando a forma de ser ou de parecer, de conviver ou de agradar, de conquistar ou de utilizar-se, dando surgimento, quase sempre, quando não correta, a inúmeros conflitos, a diversas culpas.
Constrangida a ocultar a sua realidade, a fim de não ser punida, sentindo-se obrigada a agradar os seus orientadores, a criança compõe um quadro de aparência como forma de conveniência, frustrando-se profundamente e perturbando o caráter moral que perde as diretrizes de dignidade, os referenciais do que é certo e do que é errado.
Essa má-educação é imposta para que os educandos sejam bons meninos e boas meninas, o que equivale dizer, que atendam sempre aos interesses dos adultos, não os contrariando, não os desobedecendo. Bem poucas vezes se pensa no bem estar da criança, no que lhe apraz, naquilo que lhe é compatível com o entendimento.
Vezes outras, como forma escapista da própria consciência os pais cumulam os filhos com brinquedos e jogos, em atitude igualmente infantil de suborno emocional, a fim de os distrair, em realidade, no entanto, para fugirem ao dever da sua companhia, dos diálogos indispensáveis, da convivência educativa mais pelos atos do que pelas palavras.
Apesar de se pretender tornar independente o educando, invariavelmente ele cresce co-dependente, isto é, sem liberdade de ação, de satisfação, culpando-se toda vez que se permite o prazer pessoal fora dos padrões estabelecidos e das imposições programadas.
Para poupar-se a problemas, perde a capacidade de dizer não, a espontaneidade de ser coerente com o que pensa, com o que sente, com o que deseja.
Não poucas vezes, a criança é punida quando se opõe, quando externa o seu pensamento, quando se nega, alterando a maneira de ser, a fim e evitar-se os sofrimentos.
Há uma necessidade psicológica de se negar, de se dizer não, sempre que se faça próprio, sem a utilização de métodos escapistas que induzem à pusilanimidade, à incoerência de natureza moral.
Não se pode concordar com tudo, e, desse facto, omitir-se de dizer o que se pensa, de se negar, de se ser autêntico. Certamente a maneira de expressar a opinião é que se torna relevante, evitando-se a agressividade na resposta negativa, a prepotência na maneira de traduzir o pensamento oposto. Torna-se expressivo, de certo modo, não exatamente o que se diz, mas a maneira como se enuncia a informação.
Esse hábito, porém, deve ser iniciado na infância, embutindo-se no comportamento do educando a coragem de ser honesto, mesmo que a preço de algum ônus.
Essa insegurança na forma de proceder e a dubiedade de conduta, a que agrada aos outros e aquela que a si mesmo satisfaz, quase sempre desencadeiam processos sutis de culpa, que passam a zurzir o indivíduo na maioria das vezes em que é convidado a definir rumos de comportamento.
A culpa pode apresentar-se a partir do momento em que se deseja viver a independência, como se isso constituísse uma traição, um desrespeito àqueles que contribuíram para o desenvolvimento da existência, que deram orientação, que se esforçaram pela educação recebida. Entretanto, merece considerar que, se o esforço foi realizado com o objetivo de dar felicidade, a mesma começa a partir do instante em que o indivíduo se afirma como criatura, em que tem capacidade para decidir, para realizar, para se fazer independente.
 Os adultos imaturos, no entanto, diante desse comportamento cobram o pagamento pelo que fizeram, dizendo-se abandonados, queixando-se de ingratidão, provocando sentimentos injustificáveis de culpa, conduta essa manipuladora e infeliz.
Esse método abusivo é normalmente imposto à infância, propiciando que a culpa se instale, quando a criança se dá conta de que pensa diferente dos seus pais, exigindo desses educadores sabedoria para poderem diluí-la e apoiarem o que seja correto, modificando o que não esteja compatível com a educação.
A culpa é algoz persistente e perigoso, que merece orientação psicológica urgente.

Processos de Libertação da Culpa

Há uma culpa saudável que deve acompanhar os atos humanos quando os mesmos não correspondem aos padrões do equilíbrio e da ética. Esse sentimento, porém, deve ser encarado como um sentido de responsabilidade.
Sem ela, perder-se-ia o controle da situação, permitindo que os indivíduos agissem irresponsavelmente.
Todas as criaturas cometem erros, alguns de natureza grave. No entanto, não tem por que desanimar na luta ou abandonar os compromissos de elevação moral.
O antídoto para a culpa é o perdão. Esse perdão poderá ser direcionado a si mesmo, a quem foi a vítima, à comunidade, à Natureza.
Desde que a paz e a culpa não podem conviver juntas, porque uma elimina a presença da outra, torna-se necessário o exercício da compreensão da própria fraqueza, para que possa a criatura libertar-se da dolorosa injunção.
A coragem de pedir perdão e a capacidade de perdoar são dois mecanismos terapêuticos liberadores da culpa.
Consciente do erro, torna-se exequível que se busque uma forma de reparação, e nenhuma é mais eficiente do que a de auxiliar aquele a quem se ofendeu ou prejudicou, ensejando-lhe a recomposição do que foi danificado.
Tratando-se de culpa que remanesce no inconsciente, procedente de existência passada, a mudança de atitude em relação à vida e aos relacionamentos, ensejando-se trabalho de edificação, torna-se o mais produtivo recurso propiciador do equilíbrio e libertador da carga conflitiva.
Ignorando-se-lhe a procedência, não se lhe impede a presença em forma de angústia, de insegurança, de insatisfação, de ausência de merecimento a respeito de tudo de bom e de útil quanto sucede... Assim mesmo, o esforço em favor da solidariedade e da compaixão, elabora mecanismos de diluição do processo afligente.
É comum que o sentimento de vergonha se instale no período infantil, quando ainda não se tem ideia de responsabilidade de deveres, mas se sabe o que é correto ou não para praticar. Não resistindo ao impulso agressivo ou à ação ilegítima, logo advém a vergonha pelo que foi feito, empurrando para fugas psicológicas automáticas que irão repercutir na idade adulta, embora ignorando-se a razão, o porquê.
A culpa tem a ver com o que foi feito de errado, enquanto que o sentimento de vergonha denota a consciência da irresponsabilidade, o conhecimento da ação negativa que foi praticada.
Somente a decisão de permitir-se herança perturbadora, que remanesce do período infantil, superando-a, torna possível a conquista do equilíbrio, da auto-segurança, da paz.
A saúde mental e comportamental impõe a libertação da culpa, utilizando-se do contributo valioso do discernimento que avalia a qualidade das ações e permite as reparações quando equivocadas e o prosseguimento delas quando acertadas."
“Conflitos Existenciais”, Divaldo Franco pelo esp. Joanna de Angelis

Na Explanação desta terça-feira. dia 1 de agosto, procuraremos explorar mais a segunda hipotese aqui tão bem apresentada pela Veneranda Joanna de Angelis, procurando trazer não apenas as culpas que nos vem da educação familiar mas de toda a estrutura social. Procurando compreender qual o nosso papel e o que é necessário mudar num perspetiva construtivista.

“Crede que estas sábias palavras: “Amai muito, para serdes amados”, seguirão os seus cursos. Esta máxima é revolucionária e segue uma rota firme e invariável. Mas vós já haveis progredido, vós que me escutais: sois infinitamente melhores do que há cem anos; de tal maneira vos modificastes para melhor, que aceitais hoje sem repulsa uma infinidade de ideias novas sobre a liberdade e a fraternidade, que antigamente teríeis rejeitado. Pois daqui a cem anos aceitará também, com a mesma facilidade, aquelas que ainda não puderam entrar na vossa cabeça.(...) E como tudo se encadeia, sob as ordens do Altíssimo, todas as lições recebidas e assimiladas resultarão nessa mudança universal do amor ao próximo. (...) Todos se reunirão, para entender-se e amar-se, destruindo todas as injustiças..."

ESE, Cap. XI, item 10

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